O fungo entomopatogênico Metarhizium anisopliae é amplamente utilizado para o controle de várias pragas no Brasil. A maioria dos produtos biológicos comerciais usa formulações com os conídios do fungo como princípio ativo. Os conídios, ou conidiosporos, são esporos produzidos na reprodução assexuada dos fungos. Eles são livres, não estão contidos dentro de um invólucro, permitindo a perpetuação e grande dispersão do fungo no ambiente, além de sobreviverem em condições ambientais adversas.
Fungo metarhizium anisopliae
O gênero Metarhizium inclui várias espécies de fungos entomopatogênicos filamentosos que têm sido utilizados para o controle biológico de pragas. Eles demonstram efeitos positivos na promoção do crescimento de plantas, como pastagens e cana-de-açúcar.
Espécies desse gênero, como Metarhizium robertsii, Metarhizium humberi e Metarhizium anisopliae, podem ser encontradas habitando os solos de diversas regiões brasileiras, na rizosfera de plantas ou em cadáveres de artrópodes.
No artigo Metarhizium spp., cosmopolitan insect-pathogenic fungi: mycological aspects, os pesquisadores Donald W. Roberts e Raymond J. St Leger descrevem a ocorrência do M. anisopliae em mais de 300 espécies de artrópodes, incluindo insetos e ácaros de importância agrícola.
A história do uso desses fungos benéficos na agricultura começou com a descrição da espécie Metarhizium anisopliae na Rússia, em 1879, por um pesquisador chamado Metschnikoff, que na época o classificou como Entomophora anisopliae.
No Brasil, o estudo do uso agrícola desse fungo entomopatogênico só se deu quase meio século depois, em 1923.
Na ocasião, Pestana identificou duas espécies de cigarrinhas infectadas por M. anisopliae e posteriormente, em 1955, o italiano Pietro Guagliumi realizou vários estudos do seu uso para controle biológico das cigarrinhas da cana-de-açúcar e das pastagens.
No artigo Eficiência de Metarhizium anisopliae (Metsch.) no controle de Mahanarva fimbriolata (Stål) (Hemiptera: Cercopidae) em cana-de-açúcar, Leila L. Dinardo-Miranda e outros pesquisadores observaram uma eficiência de mais de 90% do fungo M. anisopliae, para redução das populações da cigarrinha-das -raízes.
Quais as pragas controladas pelo Metarhizium anisopliae?
O fungo Metarhizium anisopliae é considerado um inseticida microbiológico indicado para as seguintes espécies:
Além desse inseto-praga, o Metarhizium anisopliae também vem sendo estudado no Brasil para o controle de outras pragas, como por exemplo:
- Cigarrinha das pastagens (Deois flavopicta (Stal) e Zulia entreriana (Berg));
- Percevejos da soja (espécies dos gêneros Nezara e Piezodorus);
- Broca da cana-de-açúcar (Diatraea saccharalis Fabricius);
- Broca da bananeira (Cosmopolites sordidus (Germar));
- Percevejo-do-colmo do arroz (Tibraca limbativentris);
- Formiga mandioca (Atta sexdens sexdens Linnaeus);
- Cigarrinha das folhas (Mahanarva posticata (Stal));
- Broca-dos-citros (Diploschema rotundicolle);
- Broca-do-café (Hypothenemus hampei);
- Várias espécies de carrapatos, cupins, gafanhotos e outros insetos.
Deois flavopicta (cigarrinha-dos-capinzais)
O inseto apresenta coloração preta com duas faixas transversais amarelas nas asas. O abdômen e as pernas são vermelhas, o que caracteriza bem a espécie. Provocam danos em gramíneas forrageiras, mas também em milho safrinha, principalmente quando consorciado com braquiárias. Nas pastagens sugam a seiva da planta e injetam toxinas. Seu ataque deixa parte do pasto amarelado, caracterizando a “queima do pasto”.
Imagem: Adulto de Deois flavopicta, a cigarrinha das pastagens.
Fonte: Vinícius Rodrigues de Souza
Imagem: Pastagem com sintomas de ataque de Deois flavopicta,
Fonte: Embrapa
Mahanarva fimbriolata (cigarrinha-da-raiz)
O inseto apresenta coloração avermelhada nos machos e marrom nas fêmeas. São consideradas o grupo de insetos que causam os maiores danos na cultura da cana-de-açúcar. Seus danos podem causar severas perdas na produção. Podem também infestar cultivos como arroz, cana-de-açúcar, milho, sorgo e pastagens.
Sua infestação é identificada pela presença de uma espuma esbranquiçada, na base das touceiras. Os adultos ficam na parte aérea da planta, sugando os colmos. Ao succionarem a seiva da planta, transmitem toxinas que causam a queima das folhas.
Os sintomas mais comuns da infestação são estrias amarelas no limbo foliar, bordos enrolados e definhamento do colmo. Provocam perda de peso e redução na quantidade de açúcar, um grave problema para a indústria.
Imagem: Espuma característica da infestação de Mahanarva fimbriolata.
Fonte: Grupo Cultivar
Imagem: Macho e fêmea da cigarrinha-da-raiz.
Fonte: Grupo Cultivar
Zulia entreriana (cigarrinha-da-raiz)
Mede cerca de 7 mm de comprimento, com coloração preta. Apresentam uma faixa transversal branca amarelada na asa, bastante característica da espécie. As ninfas causam danos menores quando sugam o perfilho.
Já os adultos causam sérios prejuízos às plantas. Quando sugam o colmo das plantas, injetam toxinas que prejudicam seu desenvolvimento. Os sintomas aparecem com aspecto de queima e coloração amarelada.
Como atua o fungo Metarhizium anisopliae?
O fungo Metarhizium anisopliae atua de duas maneiras distintas nas plantações. De acordo com a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), ele contribui para:
- A produção de enzimas, hormônios e metabólitos que estão envolvidos na promoção do crescimento das plantas;
- A morte direta de insetos praga ao entrarem em contato com os inóculos deste microrganismo.
Mas como o Metarhizium anisopliae atua para causar a morte dos insetos praga? O processo inicia quando os esporos assexuados (conhecidos como conídios) do M. anisopliae entram em contato direto com o corpo do inseto hospedeiro e germinam. Depois disso, o inseto é eliminado em questão de dias.
O processo de infecção, normalmente, é mediado por genes específicos, enquanto a letalidade e a virulência estão mais diretamente correlacionadas à produção de compostos tóxicos com ação inseticida, como as destruxinas.
Qual é a dose de Metarhizium anisopliae utilizada para o controle das cigarrinhas-das-raízes em canavial?
É importante compreender a tecnologia de aplicação desses produtos biológicos à base de conídios de Metarhizium para seu uso efetivo no campo. Algumas considerações para a aplicação incluem:
- Realizar em dias com umidade relativa do ar superior a 60%, em dias nublados, quando a cultura estiver fazendo sombra ou no final da tarde;
- Esperar de 14 a 21 dias para aplicar o fungo quando mais de 50% das ninfas ainda forem pequenas, mas se houver predominância de ninfas grandes, pulverizar entre 0 e 10 dias;
- Ter cuidado com o armazenamento e o transporte desse fungo, evitando exposição ao sol e ambientes muito quentes por longos períodos;
- Não deixar a calda do bioproduto preparada por mais de 4 horas sem aplicá-la;
- A maioria das misturas é possível, mas um especialista deve ser consultado antes de realizar qualquer combinação desconhecida.
É importante conhecer algumas características do fungo:
- Metarhizium é eficaz em baixas populações de cigarrinhas-das-raízes, mas ainda mais eficaz em altas infestações. Vale ressaltar que o fungo causa uma doença na cigarrinha que se propaga e mata mais onde há altas populações.
- O residual deste fungo varia de 90 a 120 dias, sendo o menor valor para os dias muito quentes (LANZA; MONTEIRO; MALHEIROS, 2009; BORGES et al., 2011).
- Não é necessário distribuí-lo perfeitamente sobre as plantas e o solo, ao contrário do que acontece com os produtos químicos.
As formulações modernas do fungo aumentaram o sucesso do seu uso em diversas condições climáticas que antes eram extremamente limitantes. No passado, este fungo só podia ser aplicado à noite e em dias de chuva, mas hoje é possível aplicá-lo em dias nublados ou quando a cultura proporciona alguma sombra no solo.
Entre os fatores que afetam a eficácia do fungo Metarhizium anisopliae no controle de várias pragas, está a dose utilizada (ou, como é usual, a concentração de conídios viáveis). É extremamente importante conhecer a concentração de conídios disponível no produto comercial a ser adquirido e os componentes inertes que compõem a formulação.
Em condições adequadas, são necessários poucos conídios sobre um inseto para que eles germinem, penetrem seu tegumento e permitam que o fungo se desenvolva e mate a praga. Como são usados em ambientes adversos, as doses recomendadas pelos técnicos são superiores às realmente necessárias, pois Bugti et al. (2018) concluíram que, em campo, uma dose de 10.000 conídios por centímetro quadrado é suficiente para matar toda a população de algumas espécies de insetos.
Nas formulações modernas dos produtos biológicos de empresas idôneas, existem muitos componentes inertes que melhoram a ação do fungo, como protetor solar, dispersante, etc., reduzindo a necessidade de grandes concentrações de conídios. Com o avanço da tecnologia e formulações cada vez mais inovadoras, no futuro será possível a aplicação de doses muito menores, atingindo os alvos de forma mais precisa.
Hoje, para controlar as cigarrinhas-das-raízes, mais de um milhão de hectares de cana-de-açúcar utilizam inseticidas químicos à base de etiprole, imidacloprido ou tiametoxam na menor dose indicada (ou até menos, quando possível) em combinação com 60-100% da dose recomendada de Metarhizium anisopliae. Esta combinação aumenta o residual dos inseticidas, que muitas vezes falham no controle de infestações superiores a 5 ninfas por metro linear. Esta estratégia foi demonstrada por Barbosa et al. (2011) e é recomendada em vários textos técnicos (PINTO, 2019; PINTO; TRUJILLO, 2019).
A dose recomendada pela ciência para o controle das cigarrinhas-das-raízes varia entre 9×1011 e 5×1012 conídios viáveis por hectare (DINARDO-MIRANDA et al., 2004; ALVES; NEVES; FARIA, 2010; PINTO et al., 2011).
Quando se aplica 2×1012 conídios viáveis de Metarhizium anisopliae por hectare, são aplicados 20.000 conídios por centímetro quadrado no canavial. Uma cigarrinha bem desenvolvida tem 1,3 cm de comprimento e ocupa uma área entre 0,50 e 0,91 cm2 no solo. Em uma aplicação da dose citada, colocam-se cerca de 10.000 a 18.200 conídios viáveis sobre cada cigarrinha. Se o jato for direcionado para a base da planta, essa quantidade sobre a ninfa é ainda maior. Portanto, há uma margem de confiança para as grandes doses aplicadas atualmente.
Dinardo-Miranda et al. (2004) testaram os isolados CB348 e BC249 na concentração de 9×1011 conídios viáveis por hectare. Alves, Neves e Faria (2010) mencionaram os isolados IBCB-10, IBCB-348, IBCB-425 e ESALQ-1037, fazendo considerações gerais sobre todos, em doses superiores a 5×1012 conídios viáveis por hectare. Pinto et al. (2011) utilizaram o isolado IBCB425 e concluíram que a melhor concentração de conídios foi 4×1012 conídios viáveis por hectare para o controle das cigarrinhas-das-raízes em cana-de-açúcar.
Cada empresa tem uma formulação e, portanto, uma concentração de conídios específica. A maioria das empresas com o registro de seus produtos à base de Metarhizium anisopliae apresenta o mínimo necessário de conídios viáveis por hectare na dose comercial que recomendam.
Como observado por Dinardo-Miranda et al. (2004) e Loureiro et al. (2012), nem sempre uma única aplicação do fungo é suficiente para o sucesso do controle da cigarrinha. Com o passar dos anos de uso e o aumento do inóculo, vai ficando mais fácil utilizar somente Metarhizium anisopliae no controle das cigarrinhas.
Portanto, as doses ao redor de 1×1012 conídios viáveis por hectare, que para a maioria das empresas são conseguidas com 0,5 a 1,0 Kg do bioproduto comercial, são adequadas para o controle das cigarrinhas.
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Alvos: cigarrinha-da-raiz (Mahanarva fimbriolata), cigarrinha-das-pastagens (Zulia entreriana) e cigarrinha-das-pastagens ou cigarrinha-dos-capinzais (Deois flavopicta).
Reg. Mapa nº: 9115 Formulação GR
Reg. Mapa nº: 9017 Formulação WP
Ingrediente ativo: Metarhizium anisopliae
Linhagem: IBCB 425
Formulação: Pó molhável (WP) ou granulado (GR)
APLICAÇÃO
- Pulverização terrestre ou aérea;
- É necessário que durante a aplicação, o produto tenha contato direto
com a praga alvo;
- A aplicação deve ser realizada com umidade relativa elevada, preferencialmente no final da tarde ou em dias nublados, com temperaturas amenas.
MECANISMO DE AÇÃO
Parasitismo: Quando aplicado, os conídios entram em contato com a praga, germinando em poucas horas e penetrando posteriormente por diversos pontos do corpo do inseto (tegumento). A liberação de toxinas no interior do inseto reduz sua mobilidade. A partir do quarto dia após a aplicação, os primeiros insetos mortos são observados. Poucos dias após a morte, os adultos são recobertos por uma camada pulverulenta de conídios de cor verde. Os conídios, assim formados, aumentam consideravelmente a fonte de inoculo do agente biológico no campo, permitindo que o mesmo se mantenha ativo na área por período prolongado de tempo.
BENEFÍCIOS
- Em sistema de produção animal a pasto (bovinos, ovinos e caprinos), o uso de M. anisopliae tem como grande vantagem não deixar resíduo na carne e leite;
- Pode ser usado como instrumento para o Manejo Integrado de Pragas (MIP);
- Não há registro de desenvolvimento de resistência em populações de insetos-praga ao uso de M. anisopliae;
- Preserva os inimigos naturais das pragas;
- Não se tem conhecimento de casos de intoxicação de seres humanos, animais domesticados e de distúrbios ambientais causadas por este agente biológico.
Metarhizium bula
Sua formulação pó molhável e granulada facilita a aplicação e eficiência no controle de insetos.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALVES, L.F.A.; NEVES, P.; FARIA, M.R. de. Recomendações para utilização de fungos entomopatogênicos no controle de pragas. Piracicaba: CP2, 2010. 52p.
BARBOSA, H. et al. Associação de Metarhizium anisopliae (Hyp.: Clavicipitaceae) e thiamethoxam para o controle da cigarrinha-das-raízes em cana-de-açúcar. Ensaios e Ciência: Ciências Biológicas, Agrárias e da Saúde, v.15, n.5, p.41-51, 2011.
BORGES, L.R. et al. Persistência no solo de inóculo de Beauveria bassiana empregado para o controle de Hedypathes betulinus em plantio de Ilex paraguariensis. Floresta, [S.l.], v.41, n.1, 2011.
BUGTI, G.A.; BIN, W.; NA, C.; FENG, L.H. Pathogenicity of Beauveria bassiana strain 202 against sap-sucking insect pests. Plant Protect. Sci., v.54, p.111-117, 2018.
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LANZA, L.M.; MONTEIRO, A.C.; MALHEIROS, E.B. Sensibilidade de Metarhizium anisopliae à temperatura e umidade em três tipos de solos. Ciência Rural, v.39, n.1, p.6-12, 2009.
LOUREIRO, E.S. et al. Eficiência de isolados de Metarhizium anisopliae (Metsch.) Sorok. no controle da cigarrinha-da-raiz da cana-de-açúcar, Mahanarva fimbriolata (stal, 1854) (Hemiptera: Cercopidae), em condições de campo. Arquivos do Instituto Biológico, v.79, n.1, p.47-53, 2012.
PINTO, A. de S. Sucesso do controle biológico de pragas da cana-de-açúcar. Informe Agropecuário, Belo Horizonte, v.40, n.305, p.57-65, 2019.
PINTO, A. de S. et al. Eficiência do fungo Metarhizium anisopliae WP no controle da cigarrinha-das-raízes, Mahanarva fimbriolata, em cana-de-açúcar em São Paulo. In: REUNIÃO BRASILEIRA DE PRAGAS DE SOLO, 12., Piracicaba, 2011. Resumo expandido… Piracicaba: Fealq, 2011.
PINTO, A. de S.; TRUJILLO, S.E.L. Sugarcane, Cap.33, p.413-425. In: SOUZA, B.; VAZQUEZ, L.L.; MARUCCI, R.C. (Eds.). Natural enemies of insect pest in neotropical agroecosystems: biological control and functional biodiversity. Switzerland, SW: Springer, 2019. 546p.